Este trabalho de lavra do Diplomata de carreira e atual Ministro das Relações Exteriores do Brasil,
Ernesto Henrique Fraga Araújo, foi publicado originalmente nos Cadernos de
Política Exterior, editado pelo Instituto de Pesquisa de Relações
Internacionais (IPRI), do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, ano III
• número 6 • 2º semestre 2017. Disponibilizo o trabalho para que os leitores
possam conhecer melhor o pensamento do atual Ministro, a excelência de sua obra e a sintonia da perspectiva do autor com a
perspectiva do atual Governo, frente aos últimos acontecimentos que marcam
estreitas relações entre o Brasil e os Estados Unidos da América.
Trump e o Ocidente
Ernesto Henrique Fraga Araújo*
Resumo: O presidente Donald Trump propõe uma visão do Ocidente não
baseada no capitalismo e na democracia liberal, mas na recuperação do passado
simbólico, da história e da cultura das nações ocidentais. A visão de Trump tem
lastro em uma longa tradição intelectual e sentimental, que vai de Ésquilo a
Oswald Spengler, e mostra o nacionalismo como indissociável da essência do
Ocidente. Em seu centro, está não uma doutrina econômica e política, mas o
anseio por Deus, o Deus que age na história. Não se trata tampouco de uma
proposta de expansionismo ocidental, mas de um pan‑nacionalismo. O Brasil
necessita refletir e definir se faz parte desse Ocidente.
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Em janeiro de 2017, pouco depois da posse de Donald Trump, ocorreu‑me
uma imagem do futebol americano para caracterizar o que esperar do novo
presidente dos Estados Unidos: Donald Trump is Western Civilization’s Hail Mary
pass. Era a época dos playoffs da NFL, e em poucos dias viria a finalíssima, o
Superbowl, que acabou sendo o jogo mais extraordinário nos 51 anos dessa
disputa, assim como a eleição de Trump fora, talvez, a mais extraordinária da
história americana. Nessa confluência de inesperados, tanto na política quanto
no esporte nacional dos norte‑americanos, a metáfora do Hail Mary pass parecia
apropriada, mas não tive a quem apresentá‑la na época, e assim peço a vênia
daqueles que não apreciam o jogo da bola oval para utilizá‑la agora, pois me
parece que continua apropriada para caracterizar alguns elementos centrais da
administração Trump.
* Atual Ministro das Relações Exteriores do Brasil. Na época em que o
artigo foi publicado, Ernesto Araújo, Diplomata de carreira, era diretor do
Departamento dos EUA, Canadá e Assuntos Interamericanos do Ministério das
Relações Exteriores (MRE).
O “passe de Ave Maria” descreve uma situação do seguinte tipo: faltam
apenas poucos segundos de partida e seu time está perdendo. Tem a posse de
bola, mas está ainda no começo do seu campo, na altura da jarda 20 ou 30, por
exemplo. Só há tempo para mais um avanço que permita chegar ao touchdown e à
vitória. Um lançamento normal renderia no máximo umas 30 jardas, ainda muito
insuficientes. O time então parte para o lance de última esperança. O
quarterback pega a bola e a segura enquanto os seus recebedores, praticamente
todo o resto do time, correm loucamente até o fim do campo do outro lado. O
quarterback então lança o mais longe que puder, rezando para que o improvável
aconteça e a bola caia na mão de um dos recebedores, que, mesmo cercado por
todos os defensores adversários, lá na end zone, consiga milagrosamente marcar
o touchdown. No futebol americano não há nada mais emocionante do que o momento
em que a bola começa a voar num Hail Mary pass e não se sabe se a oração vai
dar certo, se o recebedor conseguirá o touchdown e o impossível se
materializará.
Muita gente não sabe que o Ocidente está jogando, muito menos que está
perdendo.
Tornou‑se corrente desmerecer qualquer um que enxergue um Ocidente
ameaçado, ou mesmo qualquer um que simplesmente tente definir o Ocidente por
oposição a algo. Vem logo a crítica: “Isso aí é Clash of Civilizations, isso
está ultrapassado, desacreditado, isso é chauvinismo, racismo, xenofobia...”.
Passou a ser politicamente incorreto e, portanto, inaceitável, nos círculos de
boa conversação, falar de uma Civilização Ocidental, ou utilizar o modelo de
relações internacionais baseado na competição entre as diferentes civilizações,
proposto por Samuel Huntington, onde uma civilização possa vencer e outra
perder. Só se pode falar de Civilização Ocidental se for para denegrir o seu
passado ou para negar a sua existência ou relevância no presente. Já quanto à
expressão “Ocidente”, acostumamo‑nos a empregá‑la apenas no sentido geopolítico
de um grupo de países da Europa e América do Norte que compartilha uma aliança
militar e uma adesão (que é proibido questionar) à economia de mercado e à
democracia representativa, basicamente um conceito da Guerra Fria e que, nessa
definição, faz pouco sentido desde o fim daquela configuração mundial.
Entretanto, se abrirmos por um momento a porta, se deixarmos de olhar
o mapa e começarmos a estudar o território, principalmente o território do
espírito, veremos uma enorme massa de palavras e sentimentos, ideias e crenças
formada ao longo de 25 ou 30 séculos (não é tanto, são apenas 100 gerações), à
qual podemos chamar Ocidente, Civilização Ocidental, uma entidade orgânica,
viva, outrora pujante, mas hoje com sintomas sérios de debilidade e até mesmo
demência, dando a impressão de que, deixadas as coisas ao seu curso natural,
poderá desaparecer para sempre em poucos anos.
Os países ocidentais gozam até de relativa saúde econômica e política.
São militarmente fortes. Não enfrentam maiores riscos ao seu sistema de vida.
Nem a Rússia nem a China nem a Coreia do Norte representam uma verdadeira
ameaça à democracia ou à liberdade dos europeus ou norte‑americanos. Os cofres
e os arsenais estão cheios, a tecnologia permite o incremento contínuo da
eficiência. Mas isso não é o Ocidente. O Ocidente é algo mais profundo, e,
nessa profundeza da sua alma, o Ocidente sofre, sofre de um mal misterioso como
o Rei Pescador na saga do Santo Graal. Alguém precisa procurar o cálice que
contém o sangue capaz de curá‑lo.
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Mas voltemos do Santo Graal a algo mais prosaico, ao futebol
americano, e perguntemos: e se Donald Trump for, hoje, o único estadista
ocidental que entende o jogo e está disposto a jogá‑lo, o único que percebe a
urgência destes últimos segundos do último tempo?
O certo é que Trump desafia nossa maneira usual de pensar. Aceitemos
esse desafio. Não nos satisfaçamos com uma caricatura, com as matérias de 30
segundos que aparecem no Jornal Nacional e tentam sempre mostrar um Trump
desconexo, arbitrário, caótico.
Assim como Ronald Reagan – formado por uma universidade insignificante
no meio dos milharais de Illinois, narrador esportivo medíocre, ator de pouco
talento – conseguiu aquilo em que gerações de políticos sofisticados e
aristocratas da Ivy League falharam, isto é, derrotar o comunismo, assim também
Donald Trump – esse bilionário com ternos um pouco largos demais, incorporador
de cassinos e clubes de golfe – parece ter hoje uma visão de mundo que
ultrapassa em muitas léguas, em profundidade e extensão, as visões da elite
hiperintelectualizada e cosmopolita que o despreza.
Em Varsóvia, no dia 6 de julho de 2017, Trump pronunciou um discurso
marcante em defesa do Ocidente. Um discurso que nenhum outro estadista no mundo
hoje teria a coragem ou a capacidade de pronunciar. O tema central é a visão de
que o Ocidente – concebido como uma comunidade de nações (e não como um
amálgama indistinto sem fronteiras) – está mortalmente ameaçado desde o
interior, e somente sobreviverá se recuperar o seu espírito.
O discurso intitula‑se Remarks by President Trump to the People of
Poland, e desde o início coloca claramente a Polônia não somente como uma
admirável nação em si mesma, mas como símbolo de resistência e fé, de uma
determinação que – espera – possa ser imitada hoje por todo o Ocidente como
forma de lutar por sua sobrevivência. “No povo polonês”, diz Trump, “vemos a
alma da Europa”. Trump usa a Polônia para procurar ensinar aos europeus o que
eles são no fundo. Através da Polônia, faz um apelo aos europeus para, ao lado
dos Estados Unidos, arregimentarem‑se em defesa da sua essência comum. De fato,
não por acaso Trump escolheu a Polônia para ali pronunciar seu chamado à defesa
do Ocidente. Identificou, nos poloneses, o espírito de luta, de resistência e
autoafirmação na adversidade, o qual reputa indispensável à sobrevivência do
Ocidente em seu conjunto. “Vocês [os poloneses] perderam a sua nação, mas nunca
perderam o seu orgulho”. A Polônia aparece no discurso como porta‑estandarte e
símbolo do Ocidente: “No povo polonês vemos a alma da Europa”, diz Trump, para
em seguida completar: “A nação de vocês é grande porque o seu espírito é grande
e o seu espírito é forte.” Essa grandeza e essa força residem na identidade
profunda do povo, da nação polonesa: “A história da Polônia é a história de um
povo que nunca perdeu a esperança, que nunca se deixou quebrar e que nunca,
nunca esqueceu quem ele mesmo é”. Trump enxerga a primazia do espírito sobre o
poder material, invocando a figura do bispo católico polonês Michael Kozal,
martirizado pelos nazistas em 1943, que dizia, conforme citado por Trump: “Mais
horrível que a derrota pelas armas é o colapso do espírito humano”.
O presidente não menciona em seu discurso, mas talvez tivesse presente
também a figura do rei polonês Jan Sobieski, que veio em socorro de Viena
cercada, prestes a cair nas mãos do exército otomano, e, na tarde de 12 de
setembro de 1683, desceu do Kahlenberg à frente de sua cavalaria, sob a
bandeira da virgem negra de Czestochowa, para derrotar as forças muito
superiores de Mustafá Pachá, salvando a Europa da dominação islâmica
Porém a principal figura polonesa a quem Trump faz apelo é o papa João
Paulo II. Em um momento central do discurso, Trump relembra a primeira missa do
papa polonês em Varsóvia, em 1979, quando um milhão de pessoas entusiasmadas
interrompeu o sermão para gritar “Queremos Deus”. O presidente americano
interpreta, nesse grito, uma fusão do nacionalismo com a fé, a fé como parte
integrante do sentimento nacional e vice‑versa: naquele momento, segundo ele
“os poloneses reafirmaram sua identidade como uma nação devotada a Deus”, pois
naquele grito “encontraram as palavras para dizer que a Polônia seria Polônia
uma vez mais”. Para Trump, o clamor dos poloneses por Deus, pela volta de Deus
ao centro de suas vidas juntamente com a recuperação da nacionalidade, a fé e a
pátria renascendo juntas depois de estraçalhadas pela ditadura materialista e
“internacionalista” imposta pelos soviéticos, esse clamor volta a ser hoje o
clamor do Ocidente: “O povo da Polônia, o povo da América, o povo da Europa
ainda gritam: Queremos Deus!”.
O discurso transita então dessa Polônia entendida como modelo em
pequena escala de toda a alma ocidental, em seu passado de resistência, para o
Ocidente de hoje. O Ocidente, em sua visão, muito longe de viver tranquilo,
sentado no topo da cadeia alimentar da globalização como muitos supõem, está
sob séria ameaça. As ameaças visíveis, Trump as encontra no “terrorismo
islâmico radical” (dito assim com todas as letras), mas também – o que pode
surpreender pelo prosaísmo neste contexto de luta existencial – na burocracia,
essa força que “drena a vitalidade e a riqueza do povo”. Porém Trump enxerga
bem mais do que esses perigos, e neles enxerga mais do que uma simples questão
de segurança ou de eficiência econômica. Para ele, o verdadeiro e enorme perigo
é a perda da própria identidade ocidental, a perda do espírito, o
desaparecimento dos “laços de cultura, fé e tradição que nos fazem quem somos”.
As forças antiocidentais, “sejam externas ou internas”, se deixadas agir,
“minarão nossa coragem, solaparão nosso espírito e enfraquecerão nossa vontade
de defender a nós mesmos e nossas sociedades”. O problema, portanto, não está
no terrorismo nem muito menos na diminuição da competitividade, mas sim, muito
mais fundo, está no desaparecimento da vontade de ser quem se é, como
coletividades identificadas com um destino histórico e uma cultura viva.
E o que é isso que o Ocidente é, e que não pode deixar de ser, sob
pena de desaparecer como civilização? Trump o explica na parte seguinte do
discurso: o Ocidente é “uma comunidade de nações”. O Ocidente é um conjunto,
certamente, mas não uma massa disforme, muito menos um agrupamento de estados
baseado em algum tratado, e sim um conjunto de nações – entidades definidas
cada qual em sua identidade histórica e cultural profunda, e não como entes
jurídicos abstratos – concebidas a partir de experiências únicas e não a partir
de princípios ou valores frios. Uma comunidade, portanto, onde os
particularismos não são um acidente, mas a sua própria essência e conformam um
todo orgânico, indispensáveis à saúde e pujança do conjunto. A erradicação das
fronteiras, o princípio supranacional, a convergência de valores – nada poderia
estar mais longe dessa concepção de Trump do Ocidente como uma comunidade de
nações.
E o que caracteriza essa comunidade, a partir das nacionalidades (e
não por cima das nacionalidades)? Trump elenca, em primeiro lugar, a arte: “as
obras de arte inspiradoras que honram a Deus”, e em seguida a inovação, a
celebração dos heróis, das tradições e dos costumes imemoriais (aquilo que, na
origem de nossa própria cultura, Camões expressou dizendo “as armas e os barões
assinalados”), o estado de direito, a liberdade de expressão, o empoderamento
das mulheres, a família no centro da vida e não o governo ou a burocracia, o
hábito de debater e questionar e a ânsia de conhecer, e “acima de tudo (...) a
dignidade de cada vida humana, (...) a esperança de cada alma de viver em
liberdade”. Aí estão “os laços sem preço que nos unem como nações, como aliados
e como uma civilização”, aquilo que “herdamos de nossos ancestrais, (...) que
nunca existiu desta maneira antes (...) e que, se fracassarmos em preservá‑lo,
nunca, jamais voltará a existir”.
Há muito tempo um líder mundial não falava dessa maneira. Trump aqui
se aproxima de Reagan e de Churchill (que se viam como os grandes defensores da
liberdade e da civilização diante da barbárie e da opressão). Entre tantas
expressões fora do comum, o apelo aos ancestrais é particularmente gritante. A
Europa pós‑moderna – junto com os Estados Unidos que, até Obama, cada vez mais
se assemelhavam à Europa – viviam ultimamente numa espécie de tanque de
isolamento histórico, viviam já fora da história, depois da história, num
estado de espírito (ou falta de espírito) onde o passado é um território
estranho. Desde o “iluminismo” toda a tradição liberal e revolucionária
constituiu‑se numa rejeição do passado – em suas várias facetas de rejeição dos
heróis, rejeição do culto religioso e rejeição da família (a família, esse
indispensável microcosmo da história, que liga o indivíduo ao tempo assim como
a nação liga um povo a um tempo). De repente “os ancestrais” aparecem no
discurso do mandatário do país que vinha liderando a “ordem liberal”, essa
mesma “ordem” que rejeitava o passado, os heróis, a fé e a família. O homem pós‑moderno
não tem ancestrais, as sociedades pós‑modernas não têm heróis. Trump, ao falar
de alma, desafia frontalmente o homem pós‑moderno, que não tem alma, que tem
apenas processos químicos ocorrendo aleatoriamente entre seus neurônios. Trump
fala de Deus, e nada é mais ofensivo para o homem pós‑moderno, que matou Deus
há muito tempo e não gosta que lhe recordem o crime.
Essas expressões de Trump parecerão a muitos, no mínimo, manifestações
de mau gosto, a outros parecerão laivos de fascismo. Sim, vivemos em um mundo
onde falar dos heróis, dos ancestrais, da alma e da nação, da família e de Deus
é, para grande parte da ideologia dominante, uma indicação de comportamento
fascista. O problema estará com Trump ou estará com essa ideologia contra a
qual ele se insurge? Os capangas de Stálin, os de Mao Tsé‑Tung e os de Pol Pot
também chamavam tudo de fascista: ter um livro era fascista, amar os pais ou os
filhos era fascista, venerar os símbolos tradicionais era fascista, tudo o que
pudesse remotamente contestar o poder dominante do estado era fascista e levava
o cidadão para o gulag, para o campo de reeducação ou para a fossa comum. Nossa
ideologia “liberal” pós‑moderna incorporou esse reflexo. Ela (ainda) não pune
as expressões de fascismo com a internação em gulags ou com a execução sumária,
mas sim com o ridículo, com o ostracismo, com o descrédito público, com a
execução sumária de sua persona política senão de sua pessoa física (embora as
agressões muito físicas das brigadas de black blocks “antifascistas” nos EUA
contra qualquer partidário de Trump já estejam alastrando‑se perigosamente pelo
país). Trump nos convida a reexaminar os postulados dessa ideologia que tomamos
como moeda corrente, como a única forma decente de pensar.
A forma política desta civilização tal como Trump a concebe é a de uma
“forte aliança de nações livres, soberanas e independentes”. A Otan aparece
como a expressão militar dessa aliança, mas Trump deixa bem claro que, sem a
aliança espiritual, esse braço armado é inútil. “Nossa defesa”, diz ele:
não é apenas um comprometimento de dinheiro,
é um comprometimento de vontade. (...) A defesa do Ocidente depende não apenas
dos meios, mas também da vontade dos seus povos (...). Podemos ter as maiores
economias e as armas mais mortíferas da Terra, mas se não tivermos famílias
fortes e valores fortes, então seremos fracos e não sobreviveremos.
O clamor pela defesa espiritual, pelo rearmamento espiritual do
Ocidente, a partir da identidade nacional, domina a parte final do discurso.
Trump enfatiza: “A questão fundamental do nosso tempo é saber se o Ocidente tem
a vontade necessária para sobreviver. Temos confiança em nossos valores para
defendê‑los a qualquer custo? Temos respeito suficiente por nossos cidadãos
para protegermos nossas fronteiras? Temos o desejo e a coragem de preservar
nossa civilização diante daqueles que querem subvertê‑la e destruí‑la?” Trump
retoma o exemplo da Polônia e narra a luta desesperada dos patriotas poloneses,
durante o levante de Varsóvia contra os nazistas, para manter aberta uma
estreita passagem entre as duas partes da cidade, a passagem da Avenida
Jerusalém, último alento dos insurgentes. A geração atual é chamada a retomar
esse combate dramático contra os novos inimigos, não podendo esquecer‑se jamais
de que, como os heróis nos recordam, “o Ocidente foi salvo com o sangue dos
patriotas”. Nesse combate, “cada metro de solo, cada centímetro de civilização
merece ser defendido com a sua vida”. (Vem à mente aqui um livro recente do
filósofo de esquerda francês Michel Onfray, Décadence, que, partindo de uma
atmosfera intelectual muito diferente de Trump, chega à conclusão, muito
semelhante, de que o Ocidente está fadado a desaparecer diante do Islã, pois os
muçulmanos estão dispostos a morrer por sua civilização e os ocidentais não).
Trump insiste em lembrar onde se trava essa nova guerra: “Nossa luta
pelo Ocidente não começa no campo de batalha, começa no nosso espírito, na
nossa vontade e na nossa alma (...).” E, nesse combate, tudo está em jogo:
“Nossa liberdade, nossa civilização, nossa sobrevivência dependem dos laços de
história, cultura e memória.” O tom em que Trump encerra o discurso é o da
peroração de um chefe aos soldados antes da batalha: “Assim como a Polônia não
se deixou quebrar, eu declaro hoje, para todo o mundo ouvir, que o Ocidente
nunca, jamais será quebrado. (...) Juntos lutemos como os poloneses – pela
família, pela liberdade, pelo país e por Deus”.